"Precisa-se de Matéria Prima para construir um País"
De João Ubaldo Ribeiro
A crença geral anterior era que Collor não servia, bem como Itamar e Fernando Henrique.Agora dizemos que Lula não serve. E o que vier depois de Lula também não servirá para nada. Por isso estou começando a suspeitar que o problema não está no ladrão corrupto que foi Collor, ou na farsa que é o Lula. O problema está em nós. Nós como POVO. Nós como matéria prima de um país. Porque pertenço a um país onde a "ESPERTEZA" é a moeda que sempre é valorizada, tanto ou mais do que o dólar. Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família, baseada em valores e respeito aos demais. Pertenço a um país onde, lamentavelmente, os jornais jamais poderão ser vendidos como em outros países, isto é, pondo umas caixas nas calçadas onde se paga por um só jornal E SE TIRA UM SÓ JORNAL, DEIXANDO OS DEMAIS ONDE ESTÃO. Pertenço ao país onde as "EMPRESAS PRIVADAS" são papelarias particulares de seus empregados desonestos, que levam para casa, como se fosse correto, folhas de papel, lápis, canetas, clipes e tudo o que possa ser útil para o trabalho dos filhos ...e para eles mesmos. Pertenço a um país onde a gente se sente o máximo porque conseguiu "puxar" a tevê a cabo do vizinho, onde a gente frauda a declaração de imposto de renda para não pagar ou pagar menos impostos. Pertenço a um país onde a impontualidade é um hábito. Onde os diretores das empresas não valorizam o capital humano. Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e depois reclamam do governo por não limpar os esgotos. Onde pessoas fazem "gatos" para roubar luz e água e nos queixamos de como esses serviços estão caros. Onde não existe a cultura pela leitura (exemplo maior nosso atual
Presidente, que recentemente falou que é "muito chato ter que ler") e não há consciência nem memória política, histórica nem econômica. Onde nossos congressistas trabalham dois dias por semana para aprovar projetos e leis que só servem para afundar ao que não tem, encher o saco ao que tem pouco e beneficiar só a alguns.
Pertenço a um país onde as carteiras de motorista e os certificados médicos podem ser "comprados", sem fazer nenhum exame. Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no ônibus, enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não dar o lugar. Um país no qual a prioridade de passagem é para o carro e não para o pedestre. Um país onde fazemos um monte de coisa errada, mas nos esbaldamos em criticar nossos governantes. Quanto mais analiso os defeitos do Fernando Henrique e do Lula, melhor me sinto como pessoa, apesar de que ainda ontem "molhei" a mão de um guarda de trânsito para não ser multado. Quanto mais digo o quanto o Dirceu é culpado, melhor sou eu como brasileiro, apesar de ainda hoje de manhã passei para trás um cliente através de uma fraude, o que me ajudou a pagar algumas dívidas. Não. Não. Não. Já basta.
Como "Matéria Prima" de um país, temos muitas coisas boas, mas nos falta muito para sermos os homens e mulheres que nosso país precisa. Esses defeitos, essa "ESPERTEZA BRASILEIRA" congênita, essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até converter-se em casos de escândalo, essa falta de qualidade humana, mais do que Collor, Itamar, Fernando Henrique ou Lula, é que é real e honestamente ruim, porque todos eles são brasileiros como nós, ELEITOS POR NÓS. Nascidos aqui, não em outra parte... Me entristeço. Porque, ainda que Lula renunciasse hoje mesmo, o próximo presidente que o suceder terá que continuar trabalhando com a mesma matéria prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos. E não poderá fazer nada... Não tenho nenhuma garantia de que alguém o possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vícios que temos como povo, ninguém servirá. Nem serviu Collor, nem serviu Itamar, não serviu Fernando Henrique, e nem serve Lula, nem servirá o que vier. Qual é a alternativa? Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror? Aqui faz falta outra coisa. E enquanto essa "outra coisa" não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados....igualmente sacaneados!!! É muito gostoso ser brasileiro. Mas quando essa brasilinidade autóctone começa a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, aí a coisa muda... Não esperemos acender uma vela a todos os Santos, a ver se nos mandam um Messias.
Nós temos que mudar, um novo governador com os mesmos brasileiros não poderá fazer nada. Está muito claro...... Somos nós os que temos que mudar. Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda nos acontecendo: desculpamos a mediocridade mediante programas de televisão nefastos e francamente tolerantes com o fracasso. É a indústria da desculpa e da estupidez. Agora, depois desta mensagem, francamente decidi procurar o responsável, não para castigá-lo, senão para exigir-lhe (sim, exigir-lhe) que melhore seu comportamento e que não se faça de surdo, de desentendido. Sim, decidi procurar o responsável e ESTOU SEGURO QUE O ENCONTRAREI QUANDO ME OLHAR NO ESPELHO. AÍ ESTÁ. NÃO PRECISO PROCURÁ-LO EM OUTRO LADO.
E você, o que pensa?.... MEDITE!!!!!"
JOÃO UBALDO RIBEIRO
A crença geral anterior era que Collor não servia, bem como Itamar e Fernando Henrique.Agora dizemos que Lula não serve. E o que vier depois de Lula também não servirá para nada. Por isso estou começando a suspeitar que o problema não está no ladrão corrupto que foi Collor, ou na farsa que é o Lula. O problema está em nós. Nós como POVO. Nós como matéria prima de um país. Porque pertenço a um país onde a "ESPERTEZA" é a moeda que sempre é valorizada, tanto ou mais do que o dólar. Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família, baseada em valores e respeito aos demais. Pertenço a um país onde, lamentavelmente, os jornais jamais poderão ser vendidos como em outros países, isto é, pondo umas caixas nas calçadas onde se paga por um só jornal E SE TIRA UM SÓ JORNAL, DEIXANDO OS DEMAIS ONDE ESTÃO. Pertenço ao país onde as "EMPRESAS PRIVADAS" são papelarias particulares de seus empregados desonestos, que levam para casa, como se fosse correto, folhas de papel, lápis, canetas, clipes e tudo o que possa ser útil para o trabalho dos filhos ...e para eles mesmos. Pertenço a um país onde a gente se sente o máximo porque conseguiu "puxar" a tevê a cabo do vizinho, onde a gente frauda a declaração de imposto de renda para não pagar ou pagar menos impostos. Pertenço a um país onde a impontualidade é um hábito. Onde os diretores das empresas não valorizam o capital humano. Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e depois reclamam do governo por não limpar os esgotos. Onde pessoas fazem "gatos" para roubar luz e água e nos queixamos de como esses serviços estão caros. Onde não existe a cultura pela leitura (exemplo maior nosso atual
Presidente, que recentemente falou que é "muito chato ter que ler") e não há consciência nem memória política, histórica nem econômica. Onde nossos congressistas trabalham dois dias por semana para aprovar projetos e leis que só servem para afundar ao que não tem, encher o saco ao que tem pouco e beneficiar só a alguns.
Pertenço a um país onde as carteiras de motorista e os certificados médicos podem ser "comprados", sem fazer nenhum exame. Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no ônibus, enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não dar o lugar. Um país no qual a prioridade de passagem é para o carro e não para o pedestre. Um país onde fazemos um monte de coisa errada, mas nos esbaldamos em criticar nossos governantes. Quanto mais analiso os defeitos do Fernando Henrique e do Lula, melhor me sinto como pessoa, apesar de que ainda ontem "molhei" a mão de um guarda de trânsito para não ser multado. Quanto mais digo o quanto o Dirceu é culpado, melhor sou eu como brasileiro, apesar de ainda hoje de manhã passei para trás um cliente através de uma fraude, o que me ajudou a pagar algumas dívidas. Não. Não. Não. Já basta.
Como "Matéria Prima" de um país, temos muitas coisas boas, mas nos falta muito para sermos os homens e mulheres que nosso país precisa. Esses defeitos, essa "ESPERTEZA BRASILEIRA" congênita, essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até converter-se em casos de escândalo, essa falta de qualidade humana, mais do que Collor, Itamar, Fernando Henrique ou Lula, é que é real e honestamente ruim, porque todos eles são brasileiros como nós, ELEITOS POR NÓS. Nascidos aqui, não em outra parte... Me entristeço. Porque, ainda que Lula renunciasse hoje mesmo, o próximo presidente que o suceder terá que continuar trabalhando com a mesma matéria prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos. E não poderá fazer nada... Não tenho nenhuma garantia de que alguém o possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vícios que temos como povo, ninguém servirá. Nem serviu Collor, nem serviu Itamar, não serviu Fernando Henrique, e nem serve Lula, nem servirá o que vier. Qual é a alternativa? Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror? Aqui faz falta outra coisa. E enquanto essa "outra coisa" não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados....igualmente sacaneados!!! É muito gostoso ser brasileiro. Mas quando essa brasilinidade autóctone começa a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, aí a coisa muda... Não esperemos acender uma vela a todos os Santos, a ver se nos mandam um Messias.
Nós temos que mudar, um novo governador com os mesmos brasileiros não poderá fazer nada. Está muito claro...... Somos nós os que temos que mudar. Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda nos acontecendo: desculpamos a mediocridade mediante programas de televisão nefastos e francamente tolerantes com o fracasso. É a indústria da desculpa e da estupidez. Agora, depois desta mensagem, francamente decidi procurar o responsável, não para castigá-lo, senão para exigir-lhe (sim, exigir-lhe) que melhore seu comportamento e que não se faça de surdo, de desentendido. Sim, decidi procurar o responsável e ESTOU SEGURO QUE O ENCONTRAREI QUANDO ME OLHAR NO ESPELHO. AÍ ESTÁ. NÃO PRECISO PROCURÁ-LO EM OUTRO LADO.
E você, o que pensa?.... MEDITE!!!!!"
JOÃO UBALDO RIBEIRO
3 Comments:
Gosto do João por ser um escritor "defeituoso".Ele escreve tudo o que gostaríamos e também o que não gostaríamos de ler. Continuamos "sacaneados" como ele o diz, porém acredito que já não somos os "mesmos brasileiros", nem vivemos como os nossos pais.Inclusive, a pessoa do espelho não é a que pensamos ser. É outra! Essa outra é a que vibra, a que vota (e elege), a que molha a mão de alguns para se furtar da multa. Não nós, nós não! Estamos sentad@s no toco esperando serviço. O arroz já está no ponto, o feijão queimou, o legume derreteu-se na panela de pressão, e ela, por pouco não estourou. É, João! Neste momento estamos invisíveis no espelho. Nós outros não somos vocês.Medite.
Modesta Trindade Theodoro - BH
Carta aberta a João Ubaldo escrita pelo prof. Lúcio Brito Castelo Branco
João, permita-me tratá-lo com informalidade, mas vamos direto ao assunto – O Brasileiro que não seria “matéria-prima” adequada para “construir um país”. Os motivos de sua catarse são compreensíveis em um contexto sócio-cultural caótico e desesperante, entretanto, o seu Brasileiro é em si mesmo uma construção abstrata e, nesse sentido pode não ser “matéria-prima” para a construção de um país imaginário, uma versão de “Alice no país das maravilhas”. Seu artigo revela uma profunda nostalgia dos países integrantes do círculo hegemônico ocidental e pseudocristão. Justamente, em uma conjuntura marcada pelo fogo sagrado dos oprimidos, segregados, massacrados há séculos pelos agentes de uma ordem repressiva e bárbara.
Os recentes acontecimentos na França e em outros países das maravilhas eurocêntricas são uma prova cabal de que os povos têm memória sim e não há droga capaz de fazê-los esquecerem-se dos horrores da barbárie colonial, dos safaris cujos troféus eram as cabeças dos negros africanos, das guerras da Argélia e da Indochina, da tortura sistematizada pelo famoso general Trinquier e assim por diante em uma listagem sem fim... O fetichismo do mercado, dos bens de consumo conspícuos, as quatro rodas encantadas são objeto do ódio do não-cidadão, do não-ser que ora, no centro da mais importante e sedutora das metrópoles européias, é contestado espontaneamente a coquetéis molotov.
Meu caro João, os nazistas, apesar de perversos e brutais, tinham a reputação de honestos e pontuais, talvez não fossem “espertos”, “fraudulentos”, “viciados” pela arte de furtar e subornar as autoridades, contudo, apesar de dedicados à leitura, liam compulsivamente “Minha Luta” ou a arte de odiar, de segregar, de destruir e liquidar. Os colonialistas ingleses, franceses, belgas, holandeses, ibéricos e outros obedeciam às leis vigentes nas metrópoles sem se perguntarem se eram ou não legítimas. No trânsito, ainda hoje, são capazes de atropelar o pedestre que atravessar com o sinal verde para o motorista todo-poderoso e, se o matar, processam a família do morto por eventuais danos causados ao sacrossanto veículo – símbolo máximo de uma civilização em guerra permanente contra o meio-ambiente.
Pois é João, você conhece bem a “Oropa, França”, porém esqueceu-se da sua Bahia, dos ritmos, dos cheiros, da lógica da capoeira, da arte de sobreviver e nadar contra de uma maré que nunca está para peixe miúdo...
É João, jamais seremos anglo-saxônicos, germânicos, franceses acima de tudo. Somos a ralé do planeta, a escória da humanidade, o “lixo e os restos mortais” da globalização da miséria, da fome e dos dejetos do apetite insaciável do colonizador pós-moderno. João, em síndrome de abstinência do porre da imortalidade, é impossível livrarmo-nos de nosso inconsciente, do peso da cor, da meta-síntese étnico-cultural, do futuro do pretérito, da recolonização de Paris, Londres, Nova York pelos latinos, muçulmanos, chicanos e até mesmo por um punhado de Jean Charles, de “alta periculosidade” para os habitantes das torres de marfim.
É isso aí João, o fardão tem um preço e a “matéria-prima” da Academia chama-se p. coelho, “nessa indústria da desculpa e da estupidez”, da mediocridade pseudo-elitista no espelho do cego!
Lúcio Brito Castelo Branco
Matéria publicada em 17/1/2006.
Sabe?! Quando falei da outra pessoa no espelho estava também me referindo a João Ubaldo. O texto não combina com os artigos que tenho lido, com os livros dele que li. Ou é texto anterior a 2004(pelo menos no que se refere ao governo), ou é texto de outrem. Não seria interessante se comunicássemos com ele para saber?!
Professora Modesta Trindade Theodoro
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