" The wall " - Jornal O Tempo
Quinta-feira, 03 de Agosto de 2006, 00h01 – BH – MG - Brasil
Modesta Trindade Theodoro
De certa forma tem razão o leitor Eustáquio Duarte (Dos Leitores, 30/7). Inclusive, ele não foge ao artigo 208 da Constituição. A obrigatoriedade do ensino esbarra no parágrafo 1º do inciso VII: “O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo”.
Ao Estado, cabe garantir sua obrigatoriedade e gratuidade. Ipsis litteris, nem seria necessário debate sobre o fato, não fosse pela subjetividade, abertura para a liberdade à freqüência aos bancos escolares.
Tampouco seriam necessárias defesas em prol da educação em tempo integral, pois há muito ela foi defendida e colocada na Lei que rege a Educação no Brasil. Nem toda lei é cumprida, sabemo-lo bem.
Cabe, então, à sociedade cobrar para que o seja, e não permitir que partidos políticos e seus partícipes façam de um dever, em reportagens e propagandas, “batalha” em véspera de eleições. Não confundamos alhos com bugalhos: cobrança não significa defesa, em última instância. E quem cita o ex-membro do Pink Floyd, Roger Waters, nem sempre pode ser considerado um revolucionário. O grupo apresentou em Berlim (1990) canções dignas da queda do muro.
Muito antes, quando Waters começou a tocar em outro grupo, nos anos 60, o professor francês Louis Althusser dissertava para seus alunos, na École Normale Supérieure, em Paris, sobre o Aparelho Ideológico de Estado escolar (sistema de diferentes escolas públicas e privadas).
“Acreditamos, portanto, ter boas razões para afirmar que, por trás dos jogos de seu Aparelho Ideológico de Estado político, que ocupava o primeiro plano do palco, a burguesia estabeleceu como seu Aparelho de Estado nº. 1 e, portanto, dominante, o aparelho escolar, que na realidade substitui o antigo Aparelho Ideológico de Estado dominante, a Igreja, em suas funções. Podemos acrescentar: o par Escola-Família substitui o par Igreja-Família”.
Com um poder de argumentação fulminante, escrevia artigos argüindo instituições. Dizia que, se um filho tivesse, não o colocaria em escolas, porque elas reproduziam a ideologia do Estado.
“A escola forma o trabalhador, mas é sempre a empresa que qualifica o trabalho – num processo em que o trabalho é simultaneamente transformado em força de trabalho.”
Apesar de defender a educação fora das escolas, o filósofo as freqüentou e nelas permaneceu até adoecer de um mal comum, não somente entre professores. Tornou - se solitário, depressivo: “Imaginem aquele encontro: duas pessoas no limite de sua solidão e do desespero, que por acaso se encontram cara a cara e reconhecem um no outro a fraternidade de uma mesma angústia, de um mesmo sofrimento, de uma mesma solidão”.
Sem todas as contradições, talvez ele não fosse o filósofo do estruturalismo, o crítico audacioso, aquele cuja pena foi matar a esposa em 1980, passando a viver na solidão individual, como incapaz, os seus últimos anos. O muro ruiu em Berlim, sua vida arruinou - se, na França.
A maioria de pais e mães, no Brasil e em outros países, não tem o poder de escolha. É impossível ficar em casa e auxiliar os filhos, ensinando as primeiras letras, apresentando - os a um outro mundo.
Deixar os filhos à mercê da escola ou da rua? A sociedade optou pela escola – e em tempo integral. As crianças poderão ficar em paz, desde que as instituições trabalhem nesse sentido. É por este motivo que a habilidade de professores no trato com crianças e adultos é importante.
A questão ideológica não mudou. Somos aparelhados, os professores se encontram emparedados pelo sistema. Culpa deles?! Eu é que não presto ao sistema o favor de desqualificar os mestres, haja vista que precisamos deles muitas vezes e, com certeza, ainda precisaremos. E eles de nós!
E quem disse que escolas servem apenas para formar “revolucionários”?! Se a maioria de professores não o é, de acordo com alguns entendidos no assunto, como isto aconteceria? Mas o que é ser “revolucionário”, afinal?
Somente políticos que almejam uma sociedade ignorante partem para o ataque aos educadores, sem argumentos suficientes, como se esses fossem culpados por cada naco de pão perdido.
Que eu saiba o missivista parece ser contraditório muitas vezes, mas não é pacóvio, tampouco possuidor de uma visão tacanha. Isto posto, questiono: onde está, realmente, a chatice? Caberia a empáfia da generalização?!
Professora aposentada/ex-sindicalista
Modesta Trindade Theodoro
De certa forma tem razão o leitor Eustáquio Duarte (Dos Leitores, 30/7). Inclusive, ele não foge ao artigo 208 da Constituição. A obrigatoriedade do ensino esbarra no parágrafo 1º do inciso VII: “O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo”.
Ao Estado, cabe garantir sua obrigatoriedade e gratuidade. Ipsis litteris, nem seria necessário debate sobre o fato, não fosse pela subjetividade, abertura para a liberdade à freqüência aos bancos escolares.
Tampouco seriam necessárias defesas em prol da educação em tempo integral, pois há muito ela foi defendida e colocada na Lei que rege a Educação no Brasil. Nem toda lei é cumprida, sabemo-lo bem.
Cabe, então, à sociedade cobrar para que o seja, e não permitir que partidos políticos e seus partícipes façam de um dever, em reportagens e propagandas, “batalha” em véspera de eleições. Não confundamos alhos com bugalhos: cobrança não significa defesa, em última instância. E quem cita o ex-membro do Pink Floyd, Roger Waters, nem sempre pode ser considerado um revolucionário. O grupo apresentou em Berlim (1990) canções dignas da queda do muro.
Muito antes, quando Waters começou a tocar em outro grupo, nos anos 60, o professor francês Louis Althusser dissertava para seus alunos, na École Normale Supérieure, em Paris, sobre o Aparelho Ideológico de Estado escolar (sistema de diferentes escolas públicas e privadas).
“Acreditamos, portanto, ter boas razões para afirmar que, por trás dos jogos de seu Aparelho Ideológico de Estado político, que ocupava o primeiro plano do palco, a burguesia estabeleceu como seu Aparelho de Estado nº. 1 e, portanto, dominante, o aparelho escolar, que na realidade substitui o antigo Aparelho Ideológico de Estado dominante, a Igreja, em suas funções. Podemos acrescentar: o par Escola-Família substitui o par Igreja-Família”.
Com um poder de argumentação fulminante, escrevia artigos argüindo instituições. Dizia que, se um filho tivesse, não o colocaria em escolas, porque elas reproduziam a ideologia do Estado.
“A escola forma o trabalhador, mas é sempre a empresa que qualifica o trabalho – num processo em que o trabalho é simultaneamente transformado em força de trabalho.”
Apesar de defender a educação fora das escolas, o filósofo as freqüentou e nelas permaneceu até adoecer de um mal comum, não somente entre professores. Tornou - se solitário, depressivo: “Imaginem aquele encontro: duas pessoas no limite de sua solidão e do desespero, que por acaso se encontram cara a cara e reconhecem um no outro a fraternidade de uma mesma angústia, de um mesmo sofrimento, de uma mesma solidão”.
Sem todas as contradições, talvez ele não fosse o filósofo do estruturalismo, o crítico audacioso, aquele cuja pena foi matar a esposa em 1980, passando a viver na solidão individual, como incapaz, os seus últimos anos. O muro ruiu em Berlim, sua vida arruinou - se, na França.
A maioria de pais e mães, no Brasil e em outros países, não tem o poder de escolha. É impossível ficar em casa e auxiliar os filhos, ensinando as primeiras letras, apresentando - os a um outro mundo.
Deixar os filhos à mercê da escola ou da rua? A sociedade optou pela escola – e em tempo integral. As crianças poderão ficar em paz, desde que as instituições trabalhem nesse sentido. É por este motivo que a habilidade de professores no trato com crianças e adultos é importante.
A questão ideológica não mudou. Somos aparelhados, os professores se encontram emparedados pelo sistema. Culpa deles?! Eu é que não presto ao sistema o favor de desqualificar os mestres, haja vista que precisamos deles muitas vezes e, com certeza, ainda precisaremos. E eles de nós!
E quem disse que escolas servem apenas para formar “revolucionários”?! Se a maioria de professores não o é, de acordo com alguns entendidos no assunto, como isto aconteceria? Mas o que é ser “revolucionário”, afinal?
Somente políticos que almejam uma sociedade ignorante partem para o ataque aos educadores, sem argumentos suficientes, como se esses fossem culpados por cada naco de pão perdido.
Que eu saiba o missivista parece ser contraditório muitas vezes, mas não é pacóvio, tampouco possuidor de uma visão tacanha. Isto posto, questiono: onde está, realmente, a chatice? Caberia a empáfia da generalização?!
Professora aposentada/ex-sindicalista
5 Comments:
Professora,
Este texto é brilhante. Merece um desdobramento para reflexão ou estudo.
Não a conheço, mas orgulho-me por termos sido colegas em alguma época. Parabéns!
Agradeço-lhe imensamente pelo comentário. Que você escreva também! Quiça eu possa dissertar sobre seus textos, ou dar uma palavra de apoio às suas ações, mesmo sem saber quem é.
Atenciosamente,
Modesta.
Jornal O Tempo - 20/8/2006
Professora exemplar
Muitos nomes causam constrangimento ao portador, alguns são até contraditórios: um sujeito grosseiro com o nome de Gentil; um ladrão, cujo prenome é Honesto; uma mulher feia que se chama Linda.
Contudo, algumas vezes, o nome condiz com a personalidade da pessoa, como é o caso da professora Modesta Trindade, que sempre nos brinda com seus artigos e missivas.
A senhora Modesta é uma incansável batalhadora. Atualmente, está aposentada. Porém, não deixou de lutar por melhores salários e condições de trabalho para os professores que, além do descaso de nossos governantes, sofrem com a indiferença dos alunos.
Eustáquio Duarte
Santa Terezinha
Belo Horizonte
Ei, não foi esse senhor acima que criticou os professores?
Parto do pressuposto de que muitas pessoas mudam de idéia a partir do momento que fazem nova leitura do dito, do escrito. É uma posição inteligente e desconcertante para quem espera radicalismos. A nós, resta-nos agradecer ao missivista. Primeiro pelas críticas,sempre bem-vindas. Segundo, por ter lido o artigo e repensado sobre o que anteriormente escreveu. Caso mude de idéia novamente, estaremos aqui, de uma forma ou de outra, para dialogar. Contudo, não sou tão parecida com meu nome. Adianto-lhes que gosto dele sobretudo por ser, antes, o nome da minha avó.
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