Jornal O Tempo - 9/6/2006
E a opinião dos estudantes?
Em meio ao turbilhão dos avanços tecnológicos que proporcionam leituras pela Internet, celulares, CD-ROMs etc, jornais, revistas e livros parecem obsoletos. Ainda assim é possível pensar acerca do que se lê desde que o texto não se afaste da busca da diversidade de situações.
O desconhecido, muitas vezes, resulta na obtenção do desejo, como aconteceu com a personagem Bárbara do conto homônimo de Murilo Rubião. Bárbara conheceu o oceano através de uma garrafa contendo um pouco da água e areia do mar.
Daí a necessidade da pluralidade de textos, que devem ser colocados à disposição para escolha. Leitura é o diálogo entre autor, texto e leitor, e começa com o aproximar-se do objeto utilizando-se da visão, do olfato, do tato, das ilustrações, dos títulos, do todo.
Recentemente, dois livros distribuídos pela Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte foram criticados pela forma como os autores abordaram os temas: violência e racismo, cultura afro-brasileira e guerra do tráfico. Os lados interessados trataram de se defender.
Uma das partes solicitando que os livros fossem recolhidos, como se isso fosse possível após a distribuição. A outra parte argumentando sobre a intenção de cada livro.
Os equívocos nessa controvérsia são, antes de tudo, os julgamentos feitos dos leitores. Estes foram escolhidos para receber os títulos. Não fizeram suas opções e, consequentemente, são colocados como passivos quanto à leitura.
Os estudantes não têm condições para avaliar veracidade, legitimidade ou verossimilhança? Não são capazes de fazer a crítica? Por que a escolha não pode partir deles?
Existem inúmeras formas de incentivo à leitura, e uma é o trabalho desenvolvido pelo professor, que cria oportunidades para o estudante selecionar o que deseja ler, na maioria das vezes, em bibliotecas.
Registre-se que muitos educadores, até o presente momento, não tiveram acesso aos livros que compõem os kits de literatura, a não ser pedindo emprestado aos estudantes, não podendo, portanto, proporcionar às classes troca de opiniões. É a partir de escolhas e motivações que se desenvolvem projetos pedagógicos.
Ler, em qualquer contexto, é pensar no que se lê, ouvir é pensar no que se ouve, ver é pensar no que se vê, estabelecendo-se o diálogo. Fica a péssima impressão, quando se trabalha numa linha inversa, de que seremos vítimas eternas de um mecanismo de manipulação e controle do nosso pensamento e da nossa voz.
Professor José Maria Theodoro
Em meio ao turbilhão dos avanços tecnológicos que proporcionam leituras pela Internet, celulares, CD-ROMs etc, jornais, revistas e livros parecem obsoletos. Ainda assim é possível pensar acerca do que se lê desde que o texto não se afaste da busca da diversidade de situações.
O desconhecido, muitas vezes, resulta na obtenção do desejo, como aconteceu com a personagem Bárbara do conto homônimo de Murilo Rubião. Bárbara conheceu o oceano através de uma garrafa contendo um pouco da água e areia do mar.
Daí a necessidade da pluralidade de textos, que devem ser colocados à disposição para escolha. Leitura é o diálogo entre autor, texto e leitor, e começa com o aproximar-se do objeto utilizando-se da visão, do olfato, do tato, das ilustrações, dos títulos, do todo.
Recentemente, dois livros distribuídos pela Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte foram criticados pela forma como os autores abordaram os temas: violência e racismo, cultura afro-brasileira e guerra do tráfico. Os lados interessados trataram de se defender.
Uma das partes solicitando que os livros fossem recolhidos, como se isso fosse possível após a distribuição. A outra parte argumentando sobre a intenção de cada livro.
Os equívocos nessa controvérsia são, antes de tudo, os julgamentos feitos dos leitores. Estes foram escolhidos para receber os títulos. Não fizeram suas opções e, consequentemente, são colocados como passivos quanto à leitura.
Os estudantes não têm condições para avaliar veracidade, legitimidade ou verossimilhança? Não são capazes de fazer a crítica? Por que a escolha não pode partir deles?
Existem inúmeras formas de incentivo à leitura, e uma é o trabalho desenvolvido pelo professor, que cria oportunidades para o estudante selecionar o que deseja ler, na maioria das vezes, em bibliotecas.
Registre-se que muitos educadores, até o presente momento, não tiveram acesso aos livros que compõem os kits de literatura, a não ser pedindo emprestado aos estudantes, não podendo, portanto, proporcionar às classes troca de opiniões. É a partir de escolhas e motivações que se desenvolvem projetos pedagógicos.
Ler, em qualquer contexto, é pensar no que se lê, ouvir é pensar no que se ouve, ver é pensar no que se vê, estabelecendo-se o diálogo. Fica a péssima impressão, quando se trabalha numa linha inversa, de que seremos vítimas eternas de um mecanismo de manipulação e controle do nosso pensamento e da nossa voz.
Professor José Maria Theodoro
3 Comments:
Cartilhas
Li o artigo escrito pelo professor José Maria Theodoro “E a opinião dos estudantes?” (Opinião, 9/6) e cheguei à conclusão de que a educação em relação à literatura nas escolas públicas está precária.
O exemplo citado no artigo, o kit escolar, não proporciona aos alunos o direito de escolha em relação a quais livros os estudantes gostariam de receber para ser feita a leitura.
Melissa Izabela Martins / Estudante
Bairro São Luiz
Escolher e indicar - 15/06/06
Há vários desdobramentos para o artigo “E a opinião dos estudantes?” (Opinião, 9/6). A questão da escolha é pertinente, o estudante é o sujeito, tem autonomia para escolher.
Mas creio que não há problema em indicar esse ou aquele livro e trabalhá-lo, desde que sirva para o crescimento intelectual e preste auxílio à formação de quem o lê. Muitos professores indicam títulos e autores consagrados ou apostam nos últimos lançamentos, além de frequentarem a biblioteca da escola com os estudantes.
O problema da distribuição é sério, porque uma equipe escolhe o que pensa ser melhor e, muitas vezes, o livro não serve a determinada faixa etária ou contém erros grosseiros de concepção. Num dos títulos distribuídos para estudantes de dez e 11 anos há a apologia ao tráfico.
Muitas meninas, ao lê-lo, terão vontade de ser como a personagem principal. Quem não gostaria de desejar uma jóia no meio da noite e tê-la em casa às cinco horas da manhã?
Marido assim é difícil, mesmo que o final seja trágico. É livro para ser vendido em livraria e, não, distribuído em kits para crianças e pré-adolescentes. Para indicar e distribuir é necessária a análise do texto e ilustrações.
A idade do leitor pesa. Mas parece que as pessoas só pensam no fato quando o livro vira filme (com censura) ou se transforma em vida real. O que os que escolhem pensariam se as escolas indicassem “Capitães da Areia”, que é um clássico da literatura brasileira, para estudantes de dez anos? Gostaria de saber.
Modesta Trindade Theodoro
As cartas acima foram publicadas no Jornal O Tempo. A 1ª em 14/06, e a 2ª no dia 15/06.
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